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Se errar é proibido, inovar também é.
Adriana Ferrareto - Edição #017

Esta é a sua newsletter semanal, enviada geralmente aos domingos, trazendo reflexões, provocações e descobertas sobre o desenvolvimento pessoal e profissional. Um espaço dedicado a quem busca explorar e maximizar seus talentos, transformando a maneira como vive e trabalha. Seja bem-vinda(o) a um momento de pausa e inspiração.
A gente erra o tempo todo. Alguns erros são bobos e a gente até ri depois. Outros ficam martelando na cabeça por dias.
Um tempo atrás, depois de muito custo, encontrei uma vaga para estacionar, peguei e paguei antecipadamente meu ticket para o dia inteiro e fui animada para um curso de escrita. O dia prometia: oito horas de imersão, muitas anotações, inspiração e aprendizado. Estava ansiosa por esse dia.
Cheguei à recepção e perguntei onde seria o curso. O atendente olhou confuso, disse que não tinha esse curso no dia. Como não? Mostrei meu comprovante, ele ficou olhando meio confuso e resolveu chamar a chefe para esclarecer. Ela pegou o ticket da minha mão e disse:
— O dia está certo, mas… você veio um mês antes do curso.
Rimos. Quer dizer, riram. Eu dei aquele sorriso amarelo de nervoso.
Saí de lá me sentindo péssima. Tinha desmarcado compromissos, acordado cedo, enfrentado trânsito e, para completar, paguei um estacionamento para um evento que nem ia acontecer.
Na volta para o carro, tentei pelo menos uma negociação com o cara do estacionamento, expliquei toda a situação, meu erro do dia e lasquei a pergunta:
— Moço, pode cancelar o ticket e me devolver a diária?
— Não posso, moça.
Fiquei ainda mais irritada. Não com ele, mas comigo. Como pude cometer um erro tão besta?
Ao longo do dia, minha indignação ia e voltava. “Que distraída, que descuidada, que perda de tempo.”
Agora, olha que curioso: se fosse outra pessoa me contando essa história, eu provavelmente diria "relaxa, acontece com todo mundo". Mas, quando somos nós que erramos, somos impiedosos.
E quando alguém da nossa equipe erra? Será que também reagimos com a mesma severidade? Se não lidamos bem com nossos próprios erros, como vamos lidar com os erros dos outros?
Enquanto to escrevendo aqui, lembrei de uma historia antiga que eu adoro e que ilustra bem essa ideia.
O medo de errar e a roupa do rei
Um rei muito vaidoso queria a melhor roupa do mundo. Dois falsos alfaiates prometeram um tecido especial, invisível para os tolos e incompetentes, (olha aí a pegadinha).
O rei, ansioso para provar que era inteligente, aceitou. Os alfaiates passaram dias fingindo costurar e, quando anunciaram que o traje estava pronto, trouxeram algo… invisível.
O rei não via nada. Mas teve medo de admitir. Afinal, se dissesse que não enxergava a roupa, estaria confessando sua própria incompetência.
Então, fingiu admiração. Seus conselheiros, percebendo a hesitação do rei, também fingiram.
E assim, o rei vestiu seu traje imaginário e saiu desfilando pelas ruas… nu.
A multidão, com medo de parecer burra ou desrespeitosa, aplaudia e elogiava o traje. Até que uma criança gritou:
— Mas ele está nu!
E a verdade ficou escancarada.
Agora, pare e pense: quantas vezes você já viu algo errado no trabalho, mas ficou em silêncio por medo da reação?
Quantas vezes sua equipe hesitou em falar, não porque não soubesse a resposta, mas porque não queria correr o risco de errar?
O medo de errar transforma o ambiente corporativo na corte do rei. Todo mundo finge que está tudo certo, mas, no fundo, sabe que há algo errado.
E isso não é só uma questão de percepção – há ciência por trás disso.
O impacto da liderança na segurança psicológica
Se você quer uma equipe que aprende e cresce, precisa criar um ambiente seguro para que erros sejam tratados como oportunidades, não como ameaças.
Porém acredito ser importante fazer um adendo antes: estamos falando de erros cotidianos, falhas operacionais e aprendizados no trabalho — não de desvios éticos, morais ou comportamentos que firam o respeito e a integridade no ambiente profissional.
Erros cotidianos são diferentes de desvios éticos e morais. Condutas como assédio, discriminação e corrupção não são "erros aceitáveis" ou questões a serem tratadas com leveza, mas sim infrações graves que exigem medidas firmes, conforme previsto na legislação. Criar um ambiente seguro para aprender com erros significa incentivo ao crescimento e à inovação – nunca encobrir comportamentos antiéticos.
Dito isso, vamos ao estudo "Impacto da liderança na segurança psicológica em organizações: scoping review", publicado na Revista de Carreiras e Pessoas (ReCaPe), a liderança tem um impacto significativo na segurança psicológica das equipes, influenciando diretamente a inovação e o aprendizado.
Os pesquisadores destacam que "a segurança psicológica mediada pela liderança afeta diretamente comportamentos como a expressão de opiniões, compartilhamento ou ocultação de conhecimento, criatividade, inovação, trabalho em equipe e aprendizagem com erros" (Santos et al., 2023).
Além disso, a pesquisa mostra que:
Líderes que adotam estilos positivos, como a liderança transformacional, promovem ambientes mais seguros, incentivando a participação ativa dos colaboradores.
Lideranças abusivas ou punitivas fazem com que os funcionários escondam informações, evitando dar sugestões ou assumir riscos (olha a história do rei aí…)
Se a liderança não cria um espaço seguro para aprender com erros, a equipe tende a reter conhecimento, perder engajamento e limitar seu próprio desenvolvimento.
Ou seja, quanto mais medo as pessoas têm de errar, mais elas se calam – e isso mata a inovação e o aprendizado.
Mas e se os erros custarem caro?
Um ambiente seguro para errar não significa aceitar falhas repetitivas, falta de responsabilidade ou descuido. Muito pelo contrário: quando o time se sente seguro para admitir erros, os problemas emergem mais cedo e podem ser corrigidos rapidamente.
O verdadeiro problema não são os erros em si, mas os erros que se escondem por medo.
O que custa caro para uma empresa não é alguém testar uma ideia nova e aprender com o que não funcionou – é um time que finge que está tudo bem, enquanto pequenos problemas viram grandes crises.
Então, como o lider pode atuar?
Um líder que não ensina pode esperar o quê?
Errar é inevitável. Mas quando o erro acontece, o líder está ali para corrigir e ensinar ou só para punir?
Liderar não é só cobrar resultado. Um líder de verdade precisa acompanhar o time, entender desafios e abrir espaço para aprendizado.
Isso significa:
Conversas semanais para falar sobre o que está indo bem e o que precisa melhorar (e não só reuniões de checklist).
Ensinar o funcionário a diagnosticar barreiras: Se algo não está funcionando, existe um plano B?
Ensinar ativamente: Não adianta esperar que o colaborador aprenda sozinho. Um bom líder desenvolve, testa e reforça novas competências.
Normalize discussões sobre erros e aprendizados, sem punição ou humilhação. Estimule a cultura do “aprendizado com erros”.
Uma prática comum em empresas inovadoras é o "post-mortem" de projetos. Após a conclusão de um trabalho, a equipe se reúne para discutir o que deu certo, o que não saiu como esperado e quais lições podem ser aplicadas no futuro. O objetivo não é encontrar culpados, mas entender como melhorar processos e evitar os mesmos erros.
Exemplo: Times de tecnologia usam post-mortems para revisar falhas em lançamentos de software, mas essa prática pode ser aplicada em qualquer equipe. O importante é garantir que os erros sejam analisados com objetividade, sem medo de represálias.Mostre sua vulnerabilidade. Se você, como líder, admite seus próprios erros, sua equipe se sentirá mais confortável para fazer o mesmo. Dizer "eu também errei nisso uma vez, e aprendi que..." demonstra que o erro não é o fim do mundo.
Evite a postura de "chefe infalível". Isso cria uma barreira entre você e sua equipe, tornando difícil a comunicação honesta.
Mas e quando alguém está errando e não percebe?
Nem sempre quem erra percebe que está errando. Seja em aspectos técnicos ou comportamentais, muitas vezes há um descompasso que precisa ser ajustado – e é justo que uma pessoa saiba disso.
Vejo com frequência profissionais indignados com certos comportamentos no momento, mas que não comunicam isso a quem precisa ouvir. O que acontece? O erro se repete, o desconforto cresce e, muitas vezes, a situação se torna insustentável.
Falar sobre erros também é um ato de cuidado e responsabilidade. Quando temos a intenção genuína de ajudar alguém a evoluir, a conversa deixa de ser um confronto e passa a ser uma oportunidade de crescimento.
Mas como abordar o assunto?
E como falar sobre o erro sem criar um clima de medo?
Muitos líderes até querem que o time aprenda com os erros, mas erram na forma como abordam a situação.
Uma abordagem que pode ajudar muito é a Comunicação Não Violenta (CNV). Em vez de acusar ou punir, a CNV estrutura a conversa de forma mais clara e construtiva. Veja um exemplo:
Observação: “Notei que o relatório foi enviado sem revisão e teve erros de informação.”
Sentimento: “Fiquei preocupado porque isso pode afetar nossa credibilidade com o cliente.”
Necessidade: “Precisamos garantir que as informações sejam precisas antes do envio.”
Pedido: “Podemos criar um checklist para validar os dados antes da próxima entrega?”
Para além disso, também solicitar a opinião do funcionário sobre o evento, suas percepções, como evitar que ocorra novamente, ajudando-o a crescer e se aprimorar com o ocorrido.
Essa abordagem mantém a confiança, evita o medo e impulsiona a melhoria contínua.
Erros grandes não acontecem quando há proximidade
Se um líder está presente, ensinando e acompanhando de perto, grandes erros dificilmente acontecem.
E mesmo que aconteçam, o funcionário já sabe como esse líder lida com erros. Ele sabe que será corrigido, orientado e incentivado a melhorar.
Esse é um líder que está junto, não acima.
No início dessa carta, eu compartilhei o meu erro – ir a um curso no mês errado. Naquele dia, eu me cobrei demais e transformei algo simples em um problema maior. Mas o que teria mudado se eu tivesse olhado para aquilo com mais leveza e usado como aprendizado?
O mesmo vale para os líderes e suas equipes. Se você se aproxima, escuta, orienta e transforma os erros em aprendizado, a confiança cresce, e os problemas ficam menores. Afinal, como já vimos, o verdadeiro problema não é errar, mas esconder os erros por medo.
Agora eu te pergunto:
No seu time, as pessoas têm liberdade para errar e aprender – ou apenas fingem enxergar a roupa do rei? Você lida com erros como oportunidades de crescimento ou como ameaças? Se o medo de errar ainda define a sua cultura, o que você pode mudar a partir de hoje?
Abraço afetuoso e até a próxima carta na semana que vem.
Adri
Quase esqueço de mencionar que esse tema foi sugerido por um leitor, o MF (vou colocar só as iniciais dele). Assim como ele, você pode sugerir assuntos que queira ler por aqui, vai ser legal ter sua sugestão também.
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